domingo, 18 de setembro de 2016

AS OBRAS


 A FÉ SEM AS OBRAS É MORTA.

   A necessidade das nossas obras para a salvação é tão lógica e tão evidente, que os próprios protestantes tiveram que retroceder neste ponto. A doutrina de salvação só pela fé, que pregaram os Primeiros Reformadores, era tão perigosa e subversiva, que para cristãos logo se mostrou insustentável. Aquilo já não era Cristianismo, era a confiança cega de que Jesus tudo perdoa conduzindo logicamente o homem ao mais desenfreado materialismo.

   Quando viram os protestantes a devastação tremenda que essas Ideias produziam no seio do povo, com a propaganda do desprezo pelas boas obras como meio para obter a salvação, perceberam claramente que não era possível prosseguir com tais ensinos.

   Mas toda a sua tática tem consistido em recuar até à doutrina católica nesta matéria, mas recuar conservando mais ou menos a mesma linguagem que usavam antigamente, recuar sem querer que se perceba que estão recuando.

   Já vimos que a antiga fórmula: SÓ A FÉ é necessária para a salvação foi substituída pela outra: SÓ A FÉ E O ARREPENDIMENTO são necessários para a salvação. 

   Entrando neste terreno, exigindo agora o arrependimento como indispensável para a conquista da vida eterna, entraram na doutrina católica da necessidade das obras para a salvação. Já tivemos ocasião de demonstrá-lo [anteriormente].

   Quaisquer fórmulas que inventem dentro deste novo sistema, por mais manhosas que elas sejam, mostram desde logo, depois de um pouco de reflexão, que são fórmulas católicas disfarçadas com a máscara de protestantes: Exigir ARREPENDIMENTO é exigir as OBRAS para a salvação: não há para onde correr.

   Vejamos, por exemplo, este modo de argumentar:

   - Os católicos afirmam que o homem se salva pela FÉ COM AS OBRAS, ajudado pela GRAÇA DE DEUS. Nós, protestantes, achamos que esta doutrina está errada. O que salva o homem é só a fé, e não as obras. O que acontece é que a fé é manifestada pelas OBRAS. Aquele que peca, que não ama a Deus, que não faz o bem que devia fazer está mostrando que NÃO TEM FÉ. Portanto, é só a fé que salva.

   - Ouçam, caros amigos. Dois indivíduos estavam discutindo: um deles possuía um automóvel e garantia que o seu carro podia andar sem gasolina. O outro apostava que não. Mas acontece que, aproveitando um descuido de seu antagonista, o primeiro colocou a gasolina no seu automóvel e o fez andar. Ganhou a aposta? Provou que tinha razão? Absolutamente não; porque o outro, como é natural, podia muito bem proceder à verificação no automóvel e, certificando-se de que este agora estava COM GASOLINA, podia muito bem desmascarar o seu opositor. 

   É o que se dá entre nós.

   Como começou o Protestantismo? Afirmando que a FÉ salva sem as obras e dizendo que esta fé consiste apenas em ACEITAR A JESUS COMO NOSSO ÚNICO E SUFICIENTE SALVADOR, COMO NOSSO SALVADOR PESSOAL. É a confiança de que Jesus nos salva, isto independentemente de obras, de arrependimento da nossa parte.

   Já fizemos a refutação desta doutrina. Mostramos com muitos textos da Bíblia, que esta noção de fé não é exata, que fé é ACREDITAR nas verdades eternas, ACREDITAR na palavra de Deus. Fizemos ver que esta fé é o PONTO DE PARTIDA para a salvação, porque a aceitação da doutrina de Jesus inclui necessariamente a aceitação de SUA MORAL, o reconhecimento dos DEVERES impostos por Cristo e que, portanto, a fé que salva é a fé coerente, a fé que não entra em contradição com as obras, a fé que não está morta, mas OPERA PELA CARIDADE (Gálatas V-6), sendo a caridade o amor de Deus sobre todas as coisas e amor ao próximo como a nós mesmos. Mostramos que se trata de uma promessa de vida eterna, e se Deus promete o Céu àquele que tem fé, é esta mesma fé que o leva a aceitar na própria Bíblia AS CONDIÇÕES em que esta promessa será cumprida (nº 80 a 84): sem praticar a virtude, sem observar os mandamentos, sem receber os sacramentos que Cristo instituiu para nossa salvação, esta não pode ser alcançada.

   Em todo este sistema de argumentação, estamos considerando a FÉ como uma virtude especial, distinta das demais virtudes, como distinta das nossas obras, do nosso modo de proceder. Acaso estávamos errados em considerá-la assim? Não é a própria Bíblia que distingue a fé das outras virtudes, quando nos diz: Agora, pois, permanecem a fé, a esperança, a caridade, estas três virtudes; porém a maior delas é a caridade (1ª Coríntios XIII-13)? Não é a própria Bíblia que nos diz que também os demônios CREEM (Tiago II-19)?

   É, portanto, neste sentido, considerando a fé como uma virtude distinta das outras, que nós dizemos que a fé sozinha não pode salvar, ela não salva sem as obras, as quais também são necessárias; e dizemos isto, apoiados no ensino claríssimo da Bíblia: Não vedes como PELAS OBRAS É JUSTIFICADO O HOMEM, E NÃO PELA FÉ SOMENTE? (Tiago II-24). Aqui não há meio de subterfúgio: São Tiago não diz que o homem é salvo pela fé, mas esta fé só se pode conhecer nas obras etc, etc. como Vocês estão dizendo; mas que o homem é salvo PELAS OBRAS, e não somente pela fé. 

   Ora, que acontece com quem quer discutir e argumentar COM CLAREZA E COM LEALDADE, porque quer realmente defender a VERDADE ou chegar ao conhecimento dela? Quem é sincero na argumentação procura, antes de tudo, explicar, de modo que não deixe margem para nenhuma dúvida, em que sentido está tomando as palavras que emprega na sua exposição. A questão é sobre A FÉ, não é assim? A obrigação de quem vai sustentar uma tese sobre a fé, é dizer bem claramente o que é que entende por esta palavra FÉ.

   Ora, quando perguntamos a Vocês o que é que entendem por FÉ, Vocês recorrem àquele velho conceito dos primeiros tempos do Protestantismo: FÉ É ACEITAR A JESUS CRISTO COMO NOSSO ÚNICO E SUFICIENTE SALVADOR, COMO NOSSO SALVADOR PESSOAL.

   Agora perguntamos: a fé tomada neste sentido ESTÁ INCLUINDO A OBEDIÊNCIA À LEI DE DEUS? ESTÁ INCLUINDO AS BOAS OBRAS, OS ATOS DAS DEMAIS VIRTUDES?

   Não, não está. A fé aí está reduzida apenas à confiança que tenho em que Jesus me salva.

   Esta definição não exclui o pecado. A prova é que de acordo com esta noção de fé os Primeiros Reformadores ensinavam que o pecador se salva SEM ARREPENDIMENTO. "Sê pecador e peca fortemente, mas confia e rejubila-te mais fortemente ainda no Cristo vencedor do pecado, da morte e do mundo", dizia Lutero na sua carta a Melanchton, em 1521, este mesmo Lutero que dizia que " a contrição que se prepara pelo exame e recapitulação e detestação dos pecados, pelos quais alguém relembra os seus anos na amargura de sua alma, ponderando a gravidade, multidão e fealdade dos pecados, a perda da eterna felicidade e aquisição da condenação eterna, ESTA CONTRIÇÃO FAZ HIPÓCRITA O HOMEM E ATÉ MAIS PECADOR" (Lutero. Edição Weimar VII-13).

   Esta definição de maneira alguma supõe que a fé se manifesta pelas obras. Pois, em que sentido se toma aí a expressão: Jesus é o nosso Único e Suficiente Salvador? Não no sentido de que o resgate foi feito por Jesus e só Ele o podia fazer, e o fez da maneira mais completa e satisfatória para nos alcançar e merecer a graça. Mas é empregada maliciosamente no sentido de que, tendo Cristo feito tudo por nós, o homem não precisa fazer mais nada; não lhe resta, portanto, salvar-se a si mesmo pela prática da virtude, pois só Cristo é quem nos salva sem a nossa cooperação. Ou, em outros termos, a cooperação do homem consiste apenas em CONFIAR. Confiando, a salvação lhe é dada de graça.

   Seria, por conseguinte, um contra-senso, uma verdadeira contradição, que o homem, afim de DEMONSTRAR que Cristo é o seu Único e Suficiente Salvador, neste mau sentido da expressão, tivesse agora que esforçar-se, obedecendo à lei divina, praticando atos de virtude etc. Assim estaria procurando salvar-se a si mesmo, para demonstrar que não se salva a si mesmo, que Jesus é o seu Único e Suficiente Salvador.

   Agora acontece que, enquanto Vocês protestantes, continuam a sustentar esta mesma definição - Crer é aceitar a Jesus como nosso Único e Suficiente Salvador, como nosso Salvador Pessoal - quando a gente menos espera, surgem Vocês mesmos dizendo que a fé se manifesta pelas OBRAS, que aquele que peca, que não ama a Deus, que não faz o bem que devia fazer está mostrando que NÃO TEM FÉ.

   Isto quer dizer que de repente passaram a tomar a palavra FÉ noutro sentido bem diferente. Fazem como o homem que às escondidas meteu a gasolina no automóvel.

   Bem, fé neste sentido de que todo aquele que peca está mostrando que não tem fé, quer dizer ADESÃO TOTAL A CRISTO, COM A INTEIRA OBEDIÊNCIA A TUDO QUANTO CRISTO ENSINOU. É não só na nossa mente, mas também no nosso modo de agir, a aceitação de Cristo, não só como Salvador, mas também como  nosso Mestre, nosso Legislador e como o Rei que domina toda a nossa vida.

   Se é neste sentido que Vocês querem tomar a palavra FÉ, então nós, católicos, não temos nenhum receio ou dúvida em dizer que BASTA A FÉ para a salvação, porque NÃO BRIGAMOS POR MERAS QUESTÕES DE PALAVRAS; o que nos interessa são as realidades da vida cristã. Mas há uma coisa: aí já não se trata de FÉ SEM AS OBRAS, trata-se de FÉ COM AS OBRAS, porque as obras já estão incluídas neste conceito de fé. Trata-se de fé COM A OBEDIÊNCIA DOS MANDAMENTOS DE CRISTO.

   Fica, sempre, de pé que a fé sem as obras não salva, porque a fé sem as obras é morta (Tiago II-26). 


Um comentário:

  1. Quando se conversa - ou se discute - com protestantes e vêm afirmando estarem salvos, e se citam para confrontá-los com passagens de S Paulo como: "com a esperança de conseguir a ressurreição dentre os mortos. Não pretendo dizer que já alcancei (esta meta) e que cheguei à perfeição. Não. Mas eu me empenho em conquistá-la, uma vez que também eu fui conquistado por Jesus Cristo. Consciente de não tê-la ainda conquistado, só procuro isto: prescindindo do passado e atirando-me ao que resta para a frente,
    persigo o alvo, rumo ao prêmio celeste, ao qual Deus nos chama, em Jesus Cristo. Fi 3 11-14.
    Com um pensamento e palavras retráteis, S Paulo demonstra confiança em se salvar, porém não se assegura soberbamente a bem aventurança eterna - mesmo se podendo admitir que foi chamada diretamente por Jesus - pois entendeu que podemos ser agraciados, não adquirentes por nós mesmos dela, ou faríamos jus a ela por algo que fizéssemos a partir de nós mesmos!
    Longe também de nós toda soberba, orgulho e arrogancia!
    Quem somos nós para barganhar com o Senhor Deus?!
    Daí que eles ficam anuviados, tratam logo de mudar de assunto ou preferem partir...
    Sente-se que eles não estão mais tão confiantes nas "certezas" com que vieram...

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